sábado, 14 de julho de 2012

OUVIDORIA PÚBLICA: MAIS DO MESMO E UM ESTUDO DE CASO


Um apanhado geral

Acompanhei a Ouvidoria-Geral do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação desde sua criação em abril de 2008. Inicialmente apenas lotado na Ouvidoria para “cooperar na implantação e no desenvolvimento de suas atividades”, a partir de agosto de 2009 passei a ser o Ouvidor-Geral, função da qual foi recentemente afastado. Durante este período coloquei neste blog várias matérias a respeito de Ouvidorias. Para consulta eventual, estas matérias vão ter seus links reproduzidos aqui, de modo a facilitar sua localização. Além disso, serão apresentadas algumas informações sobre pessoas o que, de certa forma, constitui uma espécie de pequeno histórico. Acredito que, mesmo para quem não tenha interesse específico no assunto, vale conhecer um pouco a respeito de um serviço que poderá ter crescente importância na vida dos cidadãos. Ou não, como diria Caetano Veloso, ou como sopram os ventos sobre as ouvidorias do Poder Executivo.

Visão histórica

Os Ouvidores-Gerais do Brasil Colônia foram das primeiras autoridades portuguesas que vieram para o Brasil. Seu ofício, no entanto, era diferente do atualmente praticado.
- Os Ouvidores na História do Brasil:

Existindo há tanto tempo, era provável que a presença dos Ouvidores-Gerais tivesse algum registro em nossa produção literária ou em narrativas da época. No blog são apresentadas citações de duas fontes colhidas em meu acervo pessoal; uma refere-se a 1546 e a outra a 1764. Uma pesquisa mais extensa certamente revelaria outras indicações.
- Registros históricos sobre os ouvidores:

Uma rara história em quadrinhos tendo como tema a figura do Ouvidor. Os quadrinhos são de 1956 e retirados de uma publicação didática, esta do acervo de minha esposa.
- Uma cama para o Ouvidor:


A participação em eventos

Principalmente pela circunstância de que as ouvidorias públicas são fenômenos relativamente recentes, os encontros da área são importantes não só porque trazem novas informações como permitem o contato e a troca de experiências com outros colegas ouvidores. As indicações são de alguns dos encontros de que participei.
- Seminário Internacional de Ouvidorias (Fortaleza, julho de 2009):

- Fórum Internacional de Ouvidorias (Brasília, novembro de 2009):

- Os desafios do acesso à informação (Brasília, julho de 2011):

- Reunião de Ouvidorias Públicas (Brasília, julho de 2011)

Curiosidade: o Seminário Internacional sobre Acesso à Informação, acima mencionado, foi objeto da reportagem “CGU debate os desafios de implantar o acesso à informação aos cidadãos”, publicada na revista Gestão Pública & Desenvolvimento, julho de 2011. Entre as fotos que ilustram a matéria encontra-se uma que apareço ao lado de Miriam Nisbet, do Departamento dos Serviços de Informações dos EUA.

   
Gestão Pública & Desenvolvimento, julho 2011, p. 49


A regulamentação das Ouvidorias

Um dos principais problemas das ouvidorias públicas, mormente as do Poder Executivo, é o fato de que não estão regulamentadas. Nem mesmo a sua existência é obrigatória. Isto as deixa à mercê da boa vontade e aquiescência de dirigentes. Tenho conhecimento de pelo menos uma situação em que a ouvidoria pública foi fechada quando o titular do órgão afastou-se, para concorrer a cargo eletivo, e não quis que a existência da ouvidoria pudesse ser a porta de entrada para críticas à sua gestão. Além disto, a própria existência de função gratificada para o Ouvidor tem sido objeto de utilização para outros propósitos que não os precípuos à ouvidoria. Tem-se conhecimento de vários casos na Esplanada dos Ministérios. Felizmente existem notáveis exceções, como a Ouvidoria do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, fundação vinculada à estrutura do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, onde a instituição da ouvidoria foi resultado de reivindicação da associação de servidores e cujo ouvidor é eleito e possui mandato. Outro bom exemplo é o dos agências regulamentadoras, cujo ouvidor não pertence ao órgão e é nomeado pelo Presidente da República, também com mandato.

Exemplo inequívoco da importância da regulamentação é o fato de que a aprovação da Lei de Acesso à Informação, a Lei n º12.527, de 18/11/2011, obrigou os ministérios a criarem Serviços de Informação ao Cidadão (SIC), com prazos para resposta aos pedidos formulados e responsabilização dos dirigentes responsáveis pelos dados. A formalização destas atividades é muito superior à das ouvidorias e, embora instituições distintas e com propósitos diferentes, os SICs de certa forma estão “engolindo” as ouvidorias.

A atual equipe da Ouvidoria-Geral da União trabalha no sentido de estabelecer critérios que sirvam de parâmetros para o estabelecimento e funcionamento das ouvidorias do Poder Executivo, bem como dos principais elementos e requisitos para a formação dos ouvidores. Nada obstante, existe uma iniciativa em tramitação na Câmara dos Deputados. A seguir, o que postei sobre o assunto.

- A regulamentação da atividade de Ouvidoria:

- A primeira iniciativa para regulamentar a atividade de Ouvidoria. Trata-se de um projeto pioneiro do Senador Marco Maciel, que não chegou a ser aprovado pelo Congresso Nacional:

- O projeto do Senador Marco Maciel. Nesta postagem o texo é transcrito na íntegra posto que não existe em meio eletrônico. É um raro documento histórico, conseguido graças à gentileza e à presteza no atendimento do setor de documentação da Câmara dos Deputados:


Créditos

Em qualquer atividade humana é necessário dar os devidos créditos a quem fez parte da experiência e a quem ajudou com orientações a respeito de uma atividade ainda em processo de construção.

O registro inicial refere-se a Antonio Carlos Morgado de Castro, primeiro Ouvidor-Geral do MCTI. Militar da reserva foi indicado para uma função da qual pouco tinha ouvido falar. Mesmo assim, como é próprio do espírito disciplinado dos militares, empenhou-se na nova atividade em regime de dedicação exclusiva. Concentrou-se tanto que, nos casos em que necessitávamos visitar outra Ouvidoria para recolher experiência e procedimentos, comentava ao final do dia: “foi um dia excelente, apesar do tempo que subtraímos das atividades da Ouvidoria”.  

Uma das preocupações do Dr. Morgado era colocar realizações da Ouvidoria nos relatórios. Não se conformava muito com a alegação de que uma ouvidoria não patrocina obras tal como uma prefeitura. Felizmente acabamos tendo uma realização, embora não creditada à Ouvidoria mas ao setor que a operacionalizou. Fomos procurados por uma servidora que sugeriu a instalação no hall do prédio de um coletor de pilhas, um papa-pilhas. Apresentamos a sugestão e pedimos providências ao setor próprio do ministério que, por meio de negociações com um banco comercial, conseguiu instalar um depósito específico para a coleta de pilhas. A lição a ser tirada é que, sem o respaldo da Ouvidoria provavelmente seria difícil que a sugestão fosse acolhida por alguma chefia imediata e levada ao setor competente.

Luis Gustavo de Paula Freitas Frazão, jovem recém-ingresso no serviço público, participou por um tempo relativamente curto da Ouvidoria do MCTI, afastando-se para assumir cargo público em outro concurso no qual havia sido aprovado. No tempo em que trabalhou conosco revelou-se um talento extraordinário para o tipo de serviço e seu espírito de pesquisador em muito auxiliou nossas tarefas. Uma grande coleta de dados para apresentação à Corregedoria Geral da União só foi possível graças ao seu empenho no preparo da documentação.

Especial agradecimento merece Eduardo Ramos Ferreira da Silva, que se dispôs a cobrir o extenso período em que fiquei de licença médica, cerca de seis meses, sem receber um único centavo pela tarefa. Este tipo de solidariedade e disponibilidade humana é característica cada mais rara no serviço público.
  
                                                                      
Eduardo Ramos

Para assegurar boas condições de trabalho aos analistas, foi necessário contar com a colaboração e o empenho de secretárias e estagiários. Já foram secretárias Leide Silva Barbosa e Vanusa de Jesus Medeiros, a atual é Izabel Duarte. E os estagiários que já passaram pela Ouvidoria: Jacilda Freitas Sámenezes, Daniel do Nascimento Nunes e Fernanda Cristine Bruch.

Os registros seguintes referem-se a pessoas com experiência na área e que muito ajudaram em especial nas primeiras horas da nova atividade. Neiva Renck: foi a primeira Ouvidora do Ministério da Previdência Social, hoje a maior ouvidoria pública da América Latina. Na época em que a conhecemos era Ouvidora do Ministério da Integração Nacional e, por suas orientações, tornou-se uma espécie de “madrinha” de nossa Ouvidoria. Nancir Sathler: foi Ouvidora da Secretaria de Ciência e Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro e atualmente é Ouvidora da FAETEC – Fundação de Apoio à Escola Técnica do Estado do Rio de Janeiro. Jovem, caracteriza-se por um grande entusiasmo pelo exercício da atividade e pela proposição de novas iniciativas. Finalmente, Carmen Calado, ex-Ouvidora da Universidade Federal do Rio Grande do Norte e atualmente Presidente do Fórum Nacional de Ouvidorias Universitárias. Quando na UFRN, cuja Ouvidoria fica em um prédio com paredes de vidro no centro do campus, ganhou tanta credibilidade na função que certa feita recebeu a visita de várias dezenas de alunos, os quais, ao invés de invadirem prédios da universidade como tem sido de praxe no movimento estudantil, procuraram a Ouvidoria como instância intermediária de suas reivindicações junto à Reitoria.

Nancir Sathler e Carmen Calado

Estudo de caso

A Ouvidoria-Geral da União criou uma Casoteca de Ouvidorias Públicas, isto é, um banco de informações para reunir estudos de casos que sirvam como orientação às demais ouvidorias. O estudo que apresentei, “Como responder a uma questão fora dos cânones”, foi aprovado para fazer parte da Casoteca e pode ser localizado por meio do seguinte link:


Comentário final

Foi lançado recentemente o livro “Ouvidoria Mídia Organizacional”, organizado por Luiz Carlos Assis Iazbeck (Porto Alegre, Sulina, 2012). A sua publicação é produto de uma pesquisa e de um conjunto de estudos conduzidos pelo Prof. Iazbeck com o apoio financeiro do CNPq. Como parte do trabalho, uma bolsista de iniciação científica veio me entrevistar. Ao final fez a seguinte pergunta, que não estava no roteiro: “o senhor gosta deste trabalho?” Respondi de imediato: “adoro”. Ela comentou que era o sexto ouvidor que tinha entrevistado e que todos tinham dado a mesma resposta. Isto em si mereceria um estudo à parte. Principalmente porque esta primeira geração de ouvidores chegou à função pelos caminhos mais diversos, por indicações que provavelmente atendiam às circunstâncias de cada instituição. E, nada obstante, todos acabaram se envolvendo intensamente com o trabalho e gostando do que fazem. Ou faziam, como é o presente caso.

Vida que segue...

-oO)(Oo-

5 comentários:

Rosamaria disse...

Raimundo, o MCT deve estar orgulhoso por tu teres sido seu ouvidor, nós, lavrenses, com certeza estamos.Com teu senso de organização e o amor que dedicaste, não poderia ter sido diferente.
Parabéns pelo trabalho e por tão completo post sobre o assunto.
Um abraço

Marina disse...

Entendo que as Ouvidorias desempenham um trabalho importantíssimo na defesa dos direitos do cidadão. Nós brasileiros, talvez pela longa história que temos de regimes autoritários, não costumamos recorrer muito a elas. Tive um exemplo bem recente, de que a ouvidoria de uma operadora de telefone fixo, conseguiu resolver um problema que há uns dois anos eu vinha tentanto resolver. Então não estás mais na função de ouvidor?

Nancir Sathler disse...

Sou uma pessoa movida a desafios, mas a experiência de ser Ouvidora foi uma prova muito grande no início da carreira, já que não estando completamente por dentro do assunto, tive que aprender muito sobre o dia a dia dessa nova atividade, que defino como maravilhosa. Hoje, vencidas as dificuldades , e familiarizada com a função, cito algumas atitudes que fizeram diferença: Um bom Ouvidor deve ter atitudes positivas primeiramente com seus pares.
Durante boa parte da minha vida profissional, alcancei meus objetivos assim. Sempre busquei estar atenta ao que acontece com esses companheiros, e assim aprender com eles. Então, posso dizer Tadeu, que as pessoas estão em constante evolução e nós acabamos sendo reflexo de todas aquelas com as quais interagimos ao longo da nossa carreira.
Um grande abraço.

Eduardo Ramos disse...

Caro Tadeu: saiba que para mim também foi um desafio surpreendente. Ao te substituir, pude encontrar uma Ouvidoria organizada, verdadeira revelação do seu zelo e dedicação. Minha única dificuldade foi estar a altura do seu estilo nobre de atender as demandas, para não falar no seu apoio "24 horas", apesar do seu afastamento no sentido físico. Tenha a certeza de que esse estilo me serviu de exemplo e inspiração.

Fernanda Cristine Bruch disse...

Prof. Tadeu: foi um imenso prazer ter trabalhado com o senhor. Muito obrigada pela oportunidade!