terça-feira, 16 de junho de 2009

FOTO RARA: PRIMEIRA COMUNHÃO NA FREGUESIA DE LAVRAS

“Primeira comunhão festiva de creanças celebrada na freguesia de Lavras. Em 6 de janeiro de 1914”.
Foto do acervo de Lasi La-Joya Corrêa (1902-2004).

segunda-feira, 15 de junho de 2009

VIAGEM ÀS NASCENTES DA LÍNGUA PORTUGUESA

O escritor catarinense Emanuel Medeiros Vieira, radicado em Brasília, com um grupo de colegas de ofício, participará da “Viagem às Nascentes da Língua Portuguesa”, do dia 21 de junho a 1° de julho. A viagem foi organizada pelo editor Victor Alegria – português de nascimento, mas radicado no Brasil –, proprietário da Thesaurus Editora, e começará no Porto, percorrerá várias cidades portuguesas e terminará em Lisboa, onde a “comitiva cultural” ficará durante 4 dias. Emanuel foi convidado a proferir palestras em colégios, universidades, entidades culturais, consulados, e na sede da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP).

O objetivo é fazer um intercâmbio cultural, levando livros e a palavra de alguns escritores que fazem a literatura brasileira de hoje. O autor “ilhéu-candango” (como se intitula), deverá falar sobre a atual literatura brasileira, e também sobre outros temas, meditando sobre nossas raízes açorianas, além de discutir as razões da distância cultural que nos separa dos lusitanos.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

SOBRE “OLHOS AZUIS – AO SUL DO EFÊMERO – ”

José Antonio Zago

Há mais de uma década tenho contato com os textos de Emanuel Medeiros Vieira. Recentemente li o primeiro volume de suas memórias, sobre o qual escrevi algumas linhas e as enviei ao autor.

Agora, Emanuel nos brinda com o seu livro Olhos Azuis – Ao sul do efêmero –, pela Thesaurus Ed./FAC, Brasília, 2009, 292 páginas. Eu uso o verbo brindar porque o texto faz justiça a isso.

Misto de romance, memórias, ficção, relato do real e, sobretudo, da própria construção da narrativa. Emanuel debruça sobre si mesmo para de forma catártica, como que retirando camadas e camadas da memória, num processo de elaboração, para o encontro de uma alma límpida, tal qual vivenciada na infância. Não se trata de redundância de alguns temas, contudo de assinalar, evidenciar e não deixar no esquecimento certas passagens. Verdadeiras, e não mera figura de retórica, essas passagens. Num certo sentido, cada passagem significa um triunfo da vida sobre a morte. Em algumas delas não necessariamente sobre a morte de ideais, mas da morte do corpo mesmo. E a lembrança de companheiros associados, ou melhor, irmanados na mesma busca: Canora e Wanda.

Idas e vindas, retorno à figura paterna. Doces, cigarros, conversas lembranças. Mas, nada disso apaga, pois foram momentos gravados na eternidade do e pelo autor; as andanças por Porto Alegre, São Paulo... Júlia, figura central na narrativa. Alter-ego de Emanuel? Seu anima, num linguajar junguiano? Ficção ou memórias do real?

Não importa muito se ficção ou se memórias. Emanuel expõe de maneira crua suas andanças. Não andanças sem rumo, porém bem estabelecidas. Nelas a busca da liberdade e do amor. A alma do revolucionário da liberdade e, ao mesmo tempo, a saborosa “prisão” da paixão. Os extremos. A mocidade e a madureza da vida De um lado a rudeza de questionar e lutar por direitos humanos e democráticos; de outro, a do gesto adolescente de fazer de tudo para a amada, de comprar flores, de passear de mãos dadas, de amar sem conseqüências.

Mas esses extremos aparecem também nos relatos sobre as visitas nos “porões” da (des) humanidade e na atual situação sócio-econômica que, para variar, mantém os privilégios dos que sempre tiveram a maior parte do bolo. Isso também é (des) humanidade. Afinal, toda a sociedade é fruto da construção humana e des-humana.

O romance de Emanuel trouxe-me à mente lembranças de quando li a Insustentável Leveza do Ser de Milan Kundera. O povo tcheco esmagado pela invasão Rússia cria resistências de imediato. É um peso tão concreto e tão sentido que automaticamente, ou seja, prontamente, cria resistências. Mas, a mulher não sente o peso do amado durante o ato do amor, porque este enleva, anestesia. É um peso de leveza. Contudo, o peso da ideologia alheia é leve, não perceptível, mas é um fardo ou peso tamanho que nem se percebe que está nos ombros.

Percebi essas mensagens no mais novo romance de Emanuel. As lutas contra a ditadura, as torturas e as mortes por se pensar diferente da ideologia imposta. As lutas para manter ou para compreender o amor, a perda irreparável que parece sem sentido. Por que extinguir a própria vida? Como escreveu Emanuel, quer ter, enquanto viver, condições para escrever e não ficar cego para poder ler a vida toda. Isso sumariza a celebração da sua vida, que é a produção literária. Essa produção que permite expor suas dores, amores, paixões, amor filiar, amor fraternal, ideais... Essa produção que permite tornar público o quanto é humano no sentido mais transcendental da palavra.

Olhos Azuis, tal como nosso firmamento, azulado porque contém aquilo que nos mantém vivos (nem percebemos o quanto o oxigênio é importante e vital), é um convite à celebração da vida. Mas da vida com sentido, da vida com significando, sabendo por que se vive e para quê se vive. Pareceu-me essa, não só neste texto, mas em toda a sua obra, a linha que costura o romance. Por isso, utilizei o verbo brindar no início. É um texto que brinda a vida. Viver concretamente é nascer, crescer, reproduzir e morrer? É muito disso. Mas, não é apenas isso. Vida envolve alegria, dores, idéias, paixões, inteligência, no dizer de Kierkegaard “vitórias precárias e derrotas provisórias e sempre renascentes”, enfim, é muito mais que um ciclo que observamos em outros seres vivos.

Assim, para entender Olhos Azuis é preciso ir mais além do óbvio, porque o autor quer nos passar para além das aparências das escritas, das palavras, da narrativa. Entendo, então, que o material que constitui a linha que costura o romance é especial. Fica muito óbvio, quando se vai além do óbvio, que o romance é um questionamento sobre a juventude que hoje carece de ideais. A juventude esmagada pela eletrônica, pelo cartão de crédito; um peso não sentido porque está anestesiada exatamente pela ausência de ideais, substituídos, é evidente, pela ideologia do tudo pronto ou do imediato. Como se a vida não precisasse ser construída bloco a bloco de história pessoal numa conjuntura social, mas como se a vida de cada um fosse pré-definida, sem história singular, como larvas processionárias.

Não sei se minha compreensão do romance está de acordo com o que o autor planejou passar aos leitores. Não sou escritor, porém fico em dúvida. Penso: quem escreve quer passar o que sente e elabora esses sentimentos, independente do que irá entender aquele que o lê.

E é isso, na minha simples maneira de ver literatura que a entendo. Para mim é isso que diferencia o escritor do escritor. E esse texto, mais uma vez, mostra que Emanuel é um escritor diferenciado.

segunda-feira, 1 de junho de 2009

HISTÓRIA DE LAVRAS DO SUL

A monografia abaixo é de autoria de José Raymundo Corrêa (1916-1992), servidor de carreira do IBGE. Na década de 1960 foi colaborador dos jornais de Lavras do Sul: Batovi e O Garimpeiro. Assinava colunas ora com o nome próprio, ora com pseudônimos, como “Status” e “Dom Nicolau Nenguirú”, abordando temas como tradicionalismo e fatos da história municipal. Não foi possível identificar a data de elaboração da monografia nem se foi apresentada em alguma solenidade das muitas em que participava como orador. As fotos ilustrativas são contemporâneas.

HISTÓRIA DE LAVRAS DO SUL

José Raymundo Corrêa


Apresentação

Como pesquisador espontâneo dos “fundamentos” de minha terra natal, que amo com todo o ardor e carinho de um bom lavrense, congratulo-me, sem vaidade, de poder anunciar aos meus dignos leitores, não só o nome das primeiras autoridades nomeadas, mas também o nome do primeiro DONO do atual perímetro urbano de Lavras do Sul.

Permitam-me, no entanto, dizer inicialmente como ocorreram tais fatos.

Anos atrás, propiciado pelo ilustre Dr. Ernani Leal Cachapuz, tive a honra e a satisfação de ser apresentado ao Exmo. Dr. Tarciso Antonio Taborda, que na época era Juiz de Direito, grande pesquisador e notável historiador do vizinho município de Bagé. Vindo o Dr. Tarciso a recomendar-me a leitura da obra “Anais de Bagé”, em arquivo no Museu Dom Diogo.

E aí está, Digníssimos Senhores, de como me foi dada a satisfação de conhecer o surgimento da verdadeira história de Lavras do Sul.

Primeiro Proprietário

Neste modesto relato, peço venia para dirigir minha palavra ao dono primeiro de nosso amado e querido chão: senhor Agostinho Nunes.

O senhor Agostinho Nunes desapareceu, foi ignorado! Que fim teve sua vida de opulento fazendeiro? Onde esteve assentada sua estância de rico e abastado criador, se dela nem resquícios de escombros se encontram? E sua nacionalidade, era portuguêsa? Ah! Sim... Açoriano, vindo das Ilhas Canárias...

Uma dúvida... E sua descendência, se houve, o que foi feito dela? E essa família “Nunes”, que hoje existe por aí e nada sabe a seu respeito, nem mesmo conhece que um dia ele foi dono e senhor das colinas que margeam o arroio das Lavras do Camaquã Chico, na encosta da serra do Batoví!

É, seu Agostinho Nunes, até que valeu a perda de longas e árduas horas passadas a sua procura. Foram horas, dias e mesmo meses vasculhando velhos manuscritos em Caçapava do Sul e Rio Pardo, sem contar com os momentos difíceis que passei debruçado nos velhos alfarrábios em arquivo na Prefeitura e Câmara Municipal de Lavras do Sul.

Foram momentos exaustivos, quase insanos, dedicados à procura dos primeiros homens que se assentaram às margens do Camaquã Chico, hoje arroio “Lavras do Sul”, e dedicados à lavra do ouro, preciso metal que na época existia em abundância no seu leito, que era muito acanoado e com fortes corredeiras, o que facilitava o garimpo de aluvião, sempre renovado pelas enchentes nos tempos chuvosos.


Primeiras Autoridades


Prosseguindo em minhas pesquisas, desta vez no vizinho município de Caçapava, lá encontro o livro de “Juramento e Posse dos Empregados” da recém formada comuna, e folhando-o sem maior interesse senão o de safar-me de uma responsabilidade, o que vou encontrar em sua página 7? No meio do texto, leio surpreendido: “Juiz de Paz para o 2º distrito das Lavras”! Entretanto, é forçoso dizer que por tradição oral consta que, em 1829, Domingos Rodrigues requereu e obteve uma sesmaria, sendo a primeira autoridade nomeada para a região, onde exerceu as funções de Juiz de Paz.

Isto me parece uma assertiva válida, levando em conta que desde o século passado é conhecida a Estância de São Domingos, à margem esquerda do arroio de Lavras. Desconhecendo-se, entretanto, a data e o nome do fiscal que foi mandado para a cobrança do “quinto”, que correspondia ao Governo Imperial, e para demarcar “datas” no arroio e sangas afluentes. Este fiscal tinha o título de “Guarda-Mor”.

Conforme consta do livro de “Juramentos dos Empregados de Caçapava”, arquivado naquele município, tomaram posse no cargo de Juiz de Paz, os senhores: Luiz Vicente Machado, Antonio Jacinto Pereira e Antonio da Silveira Goulart, respectivamente nomeados em 23 de março, 8 de abril, 2 e 15 de maio de 1834. Também no cargo de Oficial de Justiça, igualmente foram juramentados os senhores: Vasco José de Souza Machado, Manoel Marques da Silva e Antonio das Neves, sendo que os dois primeiros tomaram posse em maio, e o terceiro em agosto do mesmo ano.

Mas os “juramentos e posses” dos senhores moradores no “Camaquam Chico”, não param aí! Na mesma época, isto é, em 5 e 8 de maio de 1834, foram juramentados no cargo de Inspetor de Quarteirão os senhores: Antonio Joaquim Roza, Nazario José Flores, Carlos Antonio Severo, Salvador Lopes Vargas, Antonio Roiz Souto e Rafael Munhoz de Camargo.


Descoberta do Ouro




Nas páginas anteriores relatei do meu propósito de dizer aos dignos leitores o nome das primeiras autoridades nomeadas para a nossa querida terra, sempre baseado em documentos arquivados em fontes de alta veracidade. O que foi feito.

Agora, permitam-me os senhores divagar pelas asas da imaginação, dizendo de como teria ocorrido o seu povoamento inicial.

Muitos foram os cronistas e até mesmo historiadores que, de certa forma, são unânimes em como se originou a propagação do ouro em terras de Lavras do Sul, divergindo apenas em alguns pontos. Uns são de parecer que tenha ocorrido o conhecimento por parte dos índios charrúas, já convertidos e reduzidos pela Companhia de Jesus nos Sete Povos das Missões, e que a ela tenham levado tão importante achado. Outros, mais visionários, nos falam de ricos e fabulosos montes que faiscavam ao sol!

Ora, até aí estou de pleno acôrdo que dessa descoberta tenham participado esses ameríndios, pois que eu mesmo, na adolescência, tomei conhecimento de suas andanças nestas paragens, por intermédio de um fragmento de uma peça de boleadeira, na época usada pelos índios charrúas, encontrada às margens do arroio de Lavras, mais ou menos nos fundos da Companhia Velha.

Mas, daí supor-mos que assim tenha ocorrido, mesmo conhecendo a larga visão administrativa e educandária do catequisador missioneiro, e que tudo faziam para tornar seus humildes “filhos” o mais distante da cobiça de outros povos, tão sòmente catequisando e instruindo-os nas diversas fainas de uma Nação útil e temente a Deus!
Analisando esses fatores, posso conjeturar que o conhecimento da existência do ouro nestas paragens se deva aos mineiros desertores das tropas portuguesas que vinham dar combate aos espanhóis, lá pelos anos de 1774 a 1801.

Esses homens estavam iludidos pela Lei, naquêle degredo em que tudo lhes faltava e até mesmo seus minguados soldos há dez meses não lhes pagavam. Tudo, mas tudo mesmo lhes era negado. Deprimem-se, enervam-se e se atiram ao mundo, sem rumo, ao léo. Sem saber, entretanto, que estavam dando um passo para a liberdade, criando um novo mundo, um lar, se evadem. Atiram-se à aventura e aportam às márgens do arroio que o instinto lhes diz para ficarem, para lhe revolverem as entranhas ainda virgens.

Eles ficam!



Que duros momentos não teve essa gente que, se alguns cairam, não resistindo à dureza do destino, outros, em sua quase totalidade transpuzeram, heróicos as barreiras da dificuldade, legando aos seus descendentes um nome digno e honrado.
Eles ficam, e ficam na paz de Deus. Cessaram suas agonias e ansiedades de voltar para seus lares. Agora já não era mais a luta contra a fome e a dor das rixas tão freqüentes com seus companheiros de infortúnio, gente bárbara e inculta, que os atormentava. Era o amanhecer de uma nova vida!

Inicialmente, dormem ao relento com o que conseguiram surrupiar de onde escaparam.
Vão surgindo as primeiras onças de ouro (medida de peso inglêsa, equivalente a 29 gramas). Para se abrigarem do inverno que se aproxima, vão levantando os primeiro ranchos de leiva ou de páu-a-pique cobertos de capim santa-fé.

A luta pela sobrevivência é renovada. Agora já não temem a fome nem a morte, éra necessário renovar seus mantimentos para poderem aguentar o inverno que já se aproximava. Por isso se fazia necessário encontrarem comércio para o ouro já extraído. Então escolhem alguns de seus companheiros para irem à vila mais próxima a procura de comércio para o ouro e tambem fazer aquisição de gêneros essenciais a sua subsistência.



Assim se propala a riqueza do solo. É comentada em outras plagas a exuberância do ouro nas corredeiras do arroio Camaquam Chico, a amenidade do clima, a fertilidade de suas terras...

E, assim como o vento corre nas planícies, avança célere a notícia do ouro aluvionar do arroio e sangas da serra do Batoví.

Nessa época começam a chegar no Pôrto dos Casais – hoje Pôrto Alegre, os primeiros casais açorianos destinados ao povoamento e colonização da capitania de São Pedro, onde, é bem possível, já corria a notícia de ouro em terras próximas às Reduções Jesuíticas. De onde partem, segundo tradição oral, alguns casais rumo ao novo “eldorado”. Sendo mais tarde notadas as famílias de Gabriel Dias, Sebastião Mesa e Domingos Dias, como integrantes do povo recém formado. E, tanto isso é verdade, que ainda hoje vários descendentes desses velhos troncos povoam o território de Lavras.

Esses casais açorianos, hoje quase lendários, iam paulatinamente entrosando-se com aqueles primeiros faiscadores, formando sem se aperceberem, o núcleo que iria dar origem a uma das mais requintadas cidades do Rio Grande do Sul. Não por sua beleza arquitetônica, que não tem. Nem por suas riquezas incrustadas no seu subsolo. Nem pelos seus altos e baixos que tantos encantos lhes dão. Mas tão somente, somente mesmo, pela grandeza do coração de sua gente; por seu caráter desprendido e honesto; por seu espírito comunitário que tanto enobrece.

Assim é a nossa pequena cidade, mas querida terra Lavras do Sul.

Mas Lavras já nascera, já engatinhava, dando seus primeiros passos para a liberdade que tanto almejava. Aos poucos ela ia crescendo, criando um modo de vida próprio do meio embrutecido de que se originava.

Primeiras Habitações


As primeiras habitações levantadas no povoado, e destinadas à moradia e ao comércio, eram construções de agradável aspecto, de relativo conforto e bastante sólidas para atravessar os tempos e chegar até nós em toda a sua plenitude. Isto é o que podemos verificar pelo prédio onde funciona o Bar e Armazem do senhor Armando, na esquina João Pessoa com a rua Dr. Pires Porto, a primeira casa de alvenaria construída lá pelos anos de 1849 e mandada levantar pelo ilustre comerciante português senhor Antonio Fernandes Lobo. Outro atestado dos velhos tempos, foi o prédio recém demolido e que foi mandado erigir para funcionar uma “boite” com a denominação de “13 de Maio”. Era todo em pedra bruta, trabalhada com barro amassado, coberta de telhas do tipo “portuguêsa”.

Ainda no presente momento podemos apreciar o testemunho dos tempos idos, representado por algumas casas construidas, também com pedras brutas e com paredes internas de “pau-a-pique”, existentes ao lado esquerdo da Praça da Bandeira, com frente para o Nordeste, hoje já reformadas.


Primeiro Cemitério


Podendo agora anunciar que, lá pelos anos de 1829 a 1834, enquanto em Bagé eram tratadas das causas sacerdotais e espirituais do incipiente povoado de Santo Antonio das Lavras, em Caçapava faziam nomeações das primeiras autoridades executivas, e na Capital da Provincia, por Provisão Provincial de 25 sde outubro de 1831, foram demarcadas as seguintes divisas para o município de Caçapava: “Partindo do arroio Pedroso, segue pela coxilha do Piquiri, barra de São Sepé, as do Arenal, Casewi, São Luis, Piraigrassu, Ibirá, Camaquam Grande até fixar no Pedroso”.

De onde se conclui que o atual territorio de Lavras pertencia a Caçapava.

Pressupondo, no entanto, que na época havia uma delimitação de propriedades entre as sesmarias de São Domingos e a Fazenda de Agostinho Nunes. E essa divisa, não tenho dúvidas, seria às águas do arroio Camaquã de Lavras, margem esquerda para a fazenda de Agostinho Nunes e margem direita para a sesmaria de São Domingos, onde hoje se ergue a Cidade.



Bem, as provas evidenciais desta narrativa podemos encontrá-las nos “Anais de Bagé” – página 68, onde reza:

“Em 26 de novembro de 1831, foi dado Provisão a favor do Cura de Bagé autorizando-o a benzer o cemitério na fazenda de Agostinho Nunes, nas Lavras do rio Camaquam, a pedido de seu procurador Joaquim Ferreira Braga”.

Valendo-me de minhas pesquisas e indagações a informantes idosos, posso dizer aos que me honrarem com a leitura deste relato, que o primeiro cemitério benzido na fazenda do senhor Agostinho Nunes foi construido em terreno à esquerda do prédio onde hoje está instalada a Prefeitura Municipal.

Este fato tão singular foi constatado por velhos escombros encontrados no local, em forma de sepultura. Entretanto, por estar situado muito próximo a uma sanga alí existente, aquele terreno era muito úmido e, por isso, o referido Campo Santo foi, mais tarde, transferido para o terreno onde hoje está edificado o predio do Colegio Pedro Américo.

Primeira Capela

O documento de maior importância e de grande valor histórico encontrado em minhas pesquisas, foi um lavrado no livro de Provisões nº 2, a fôlha 64, em 20 de março de 1829, em arquivo no Cartório Eclesiástico de Pôrto Alegre e que autorizava aos moradores das Lavras nas imediações do Camaquam Chico (arroio de Lavras do Sul), a erigirem sob suas expensas, uma capela com a invocação de Santo Antonio. Este documento é transcrito na última página deste relato, não só por sua beleza literária, mas também por nos trazer ao conhecimento que lá pelos anos de 1829, o incipiente povoado já contava com trezentas a quatrocentas pessoas de ambos os sexos, o que equivale a mais de 70 famílias.

Mais curioso ainda, é que no mesmo cartório existe outro documento, mais antigo do que o acima mencionado, onde se constata o nome do senhor Joaquim Martins, como sendo um dos componentes do “Alistamento dos Fogos da Capela e distrito de Bagé” (fogos = lar, família) relacionado “das lavra do ouro”.

O que me leva a supor que o senhor Joaquim Martins, como representante de uma coletividade, deveria ser um cidadão respeitável e de acendrado sentimento católico.

Os anos iam passando e aquele mesmo sentimento de fé em Deus que nos primórdios de nossa formação era por todos respeitado, aos poucos foi se arrefecendo e a construção da capela caiu no esquecimento. Somente mais tarde, quando o pequeno núcleo de população tomava nova forma de bem viver, é que o capitão José Antonio de Figueiredo, já senhor de extensa área de terreno, ofereceu local para a edificação da Capela e de um novo cemitério. Quando então foi aberta uma lista de doações para a construção da capela, a qual só por voltas de 1846 é que foi erguida, com a invocação de Santo Antonio, sendo seu primeiro vigário o padre José Bastos.



Dando mostras do surto progressista verificado, o Governo Provincial, por lei nº 82, de 13 de novembro de 1847, elevou à categoria de freguesia a então capela de santo Antonio das Lavras.

E assim foi surgindo o conglomerado que anos mais tarde se chamaria de município de LAVRAS DO SUL!

Arruamento Inicial

E, assim, a pequena aldeia foi surgindo como que brotando das águas do arroio engastado nas fraldas da serra do Batoví e ia sendo levantada com arranchamento, ora com rústicos casebres próprios do meio, sendo poucas as casas de alvenaria, em geral sem rebocos externos, cujos prédios pertenciam às famílias mais abastadas.

Inicialmente, o incipiente povoado se desenvolvia com frente para o lado Norte, orientação esta que só mais tarde foi corrigida para Norte-oeste. Anos depois, com o amplo desenvolvimento do comércio, o povoado foi se transformando, tomando um aspecto mais aprazível, substituindo os casebres por habitações bem mais confortáveis e de relativo conforto, tornando o recém levantado povoado a forma de um taboleiro de xadrez.

Chegado o ano de 1885, mais precisamente a 25 de abril, a Câmara Municipal já formada, vendo a necessidade de uma urbanização, contrata com o senhor Augusto Alberto Stocky para proceder levantamento da área e elaborar uma planta da então vila, onde fosse determinado o traçado das ruas, e nomeando o senhor José Biagi para as funções de “arruador”, com a gratificação de 4.000 rs. por terreno que alinhasse e mais 1.000 rs. por prédio a que fosse dado alinhamento, pagos pelos proprietários. Quando foram demarcadas as seguintes ruas, já aprovadas pelo Executivo em 13/01/1885, iniciando pelo Oeste: Rua da Ladeira, do Comércio, 7 de Setembro, do Prado e Bela Vista, hoje respectivamente ruas Júlio de Castilhos, Dr. Pires Porto, 7 de Setembro, 15 de Novembro e Marechal Floriano.

Ruas transversais: Rua Bom Sucesso, Império, Redenção, Norberto Gomes, 28 de Janeiro e da Praia, respectivamente hoje ruas Tiradentes, Santo Antonio, Coronel Meza, Maria de Souza Barcelos, Borges de Medeiros e Av. Cel. Galvão.

Assim surgiu o conglomerado que, logo depois, o Governo Provincial elevou à categoria de vila, a então “Capela de Santo Antonio das Lavras”, por Lei nº 1363, de 9 de maio de 1882.

Ensino Público

E aquele punhado de heróicos e admiráveis “antonianos” já haviam ultrapassado as barreiras do trabalho insano no garimpo. O que lhes permitiu voltar suas esperanças para a educação e instrução de seus filhos, que iam crescendo em idade e número, sem a devida instrução pedagógica. O que era de se lamentar.

Vindo o incipiente povoado a se movimentar para a instalação de um estabelecimento escolar, que viesse resolver seus anseios, trazendo-lhes paz e tranquilidade.



Nos relata um cronista nosso conterrâneo, que, por Lei nº 44, de 12/04/1846, o Govêrno Provincial criou uma escola de primeiras letras para o sexo masculino, e que foi regida por um baiano, ex-militar, que já exercia no local o magistério particular. Alguns meses mais tarde, em 29/03/1847, foi provido no cargo de professor público o senhor Manoel João Pereira, vindo a lecionar nessa escola, que se encontrava vaga.

Entretanto, esse benefício não era restrito aos meninos do povoado, pois, passados alguns anos, o Govêrno mandou instalar uma outra escola para o sexo feminino e que foi regida pela professora Ursula Aranche de Moraes, diplomada por Provisão de 21 de agosto de 1854.

Primeiros Políticos

Lavras, antes mesmo de sua emancipação e com o acentuado desenvolvimento da mineração, do comércio e da pecuária, já se fazia representar na Casa Legislativa do município a que pertencia (Caçapava do Sul), pois para isso contava com excelente patrimônio moral e intelectual de seus homens.

Com a elevação à categoria de “Freguesia”, ocorrido em 1847, e ainda com a criação da Capela que tinha como orago a Santo Antonio, Lavras dava os primeiros passos para sua maioridade.

Segundo a Constituição Imperial, o povoado alcançou sua qualificação política em 1864, passando a ter representação no cenário da política partidária. Quando então o Serviço Eleitoral da época, que foi instituido por Lei Imperial nº 387, de 19 de agôsto de 1846, e regulamentado pelos Decretos de 23/08/1855 e de 19 de setembro do mesmo ano, pelo sistema Parlamentarista de Representação Indireta, determinou a organização da “Mesa Paroquial” da freguesia de “Santo Antonio das Lavras”, para a eleição de vereadores à Câmara Municipal da sede da comuna (Caçapava do Sul) e para Juizes de Paz do distrito (Lavras), obedecendo o critério da Legislação em vigôr. Determinava a Lei que a Mesa seria composta do Juiz de Paz do distrito, como presidente, e dois membros dentro os mais votados pelo eleitorado, que era composto de dez eleitores escolhidos entre os maiores proprietários da Paróquia, assim qualificados pelo exmo. Senhor Juiz Municipal.

É curioso notar que era condição essencial, para ser eleitor, ter renda anual superior a 200.000 reis, não importando fosse ou não analfabeto.

Cumprida as exigências da Lei, aos sete dias do mês de setembro de 1864, na Igreja Matriz (na época servia de matriz a capela que foi edificada no local onde hoje é o jardim da residência do senhor O’Donel Gomez), às nove horas, depois de missa celebrada em louvor ao Espírito Santo, foi instalada a Mesa Paroquial para a eleição de vereadores à Câmara Municipal de Caçapava e Juizes de Paz do distrito. Ocasião em que, como Presidente da Mesa, foi eleito o senhor Joaquim Vicente Machado, Juiz de Paz; como suplente o eleitor Flaubiano Vicente Machado; servindo como secretário o senhor Leonardo Severo Mesa; e mais os membros Camilo José Lopes, José Luiz Vicente Machado e o senhnor Manoel de Macedo Neto.

Ainda faziam parte da Mesa, mais os senhores eleitores João Francisco Jardim, João Francisco Ximendes, João Coelho Leal, Francisco Marques d’Avila e Florêncio Teixeira de Carvalho; como suplentes, os senhores Fermino Soares Leal, João Batista Albornoz, Francisco Martins Leite, Mauricio Gomes Jardim e Galvão Munhós de Camargo.
Assim teve início a vida Política Partidária de Lavras do Sul.

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